Desde tempos imemoriais, antes mesmo da chegada dos europeus ao Brasil, a mandioca já era cultivada e reverenciada pelos povos indígenas como base da alimentação e símbolo de fartura. Com raízes firmes no solo e no coração da cultura brasileira, esse alimento, conhecido também como aipim ou macaxeira, atravessou gerações, tornando-se essencial na mesa e na identidade do povo.
A importância da mandioca vai muito além de sua simplicidade. Dos seus tubérculos se extraem inúmeros produtos, sendo a farinha um dos mais tradicionais e simbólicos. O processo artesanal de produção da farinha é uma verdadeira dança entre o tempo, a técnica e o saber ancestral. Inicia-se com o cuidado na colheita e segue por etapas precisas: limpeza, ralação, prensagem, esfarelamento, peneiração e, finalmente, a torragem.
Cada etapa tem seu papel. Após a ralação, é essencial que a massa siga rapidamente para o restante do processo. Em climas tropicais, como o do Brasil, se ela permanecer por mais de 18 horas parada, a fermentação se instala, conferindo um gosto acre e impróprio para o consumo. A peneiração, além de homogenizar a gramatura da farinha, separa os fragmentos maiores – conhecidos como crueira – que, após secos, ainda têm utilidade como ração animal.
A torragem é o coração da produção. É nesse momento que o forneiro, com sua experiência, transforma a massa crua em farinha dourada. A temperatura, o tempo e o modo de mexer definem o sabor e a textura. Um forno muito quente pode queimar a massa ainda úmida, formando bolos grosseiros. Por isso, em muitas casas de farinha tradicionais, utilizam-se dois fornos: um para secagem leve e outro para torração final, garantindo qualidade superior ao produto.
Além da farinha, da mandioca também se extraem a tapioca, o polvilho, a goma, e diversos quitutes típicos, como o beiju, o pão de queijo e até bolos. Cada preparo guarda, em si, um pedaço da memória indígena e do engenho popular. Ela é, portanto, mais do que um alimento: é um elo entre passado e presente, terra e mesa, cultura e nutrição.
Num país com tantas desigualdades e desafios alimentares, a mandioca se ergue como símbolo de resistência, fartura e sabedoria. Herança viva dos primeiros habitantes do Brasil, ela continua a alimentar não apenas os corpos, mas também a história e a alma de um povo.
POR GUINHO CAIÇARA

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