Seu Antonio era homem de costume antigo, caiçara dos bons tempos, desses que sabiam ler os sinais do mar, entender o canto dos passarinhos e distinguir pegadas na terra molhada como quem lê uma carta. Quando o peixe escasseava nas redes, seu Antonio não se rendia à fome: calçava as botas de couro cru, pegava seu emborná e subia as trilhas do Sertão do Ubatumirim, em busca de alguma caça miúda para levar sustento à família.
Naquela noite em especial, o mato estava silencioso demais, como se a mata pressentisse algo estranho. Mesmo assim, seu Antonio seguiu firme e voltou com alguns macucos no embornal. Com o sol já querendo se impor por entre as copas das árvores e a garganta seca da longa descida pela Serra do Mar, decidiu parar numa cachoeirinha de águas frias e cristalinas que só os antigos conheciam.
Foi então que tudo mudou.
Antes mesmo de alcançar a beira da água, ele avistou uma coisa que jamais esqueceria: uma figura pequena, de corpo prateado, curvada como se examinasse o chão. Não era bicho nem gente. Os olhos da criatura brilhavam como vaga-lumes, e sua pele refletia a luz do amanhecer.
Seu Antonio parou. O coração disparou. Por um instante, o tempo pareceu se deter. A criatura também o viu — e, sem alarde, sumiu mata adentro, deslizando silenciosa entre as samambaias, como se fizesse parte do próprio mato.
Pouco depois, uma luz intensa pairou sobre a clareira da cachoeira. Não vinha do céu como um avião, nem do chão como uma lanterna. Era uma luz viva, pulsante, que fez a água da queda brilhar em tons dourados e azuis. Seu Antonio, enraizado no chão pela surpresa, só conseguiu observar enquanto aquela luz misteriosa ganhava o céu e seguia silenciosa em direção ao mar, desaparecendo no horizonte.
Ao chegar em casa, não falou de imediato. Guardou por dias aquela lembrança como quem protege um segredo sagrado. Só tempos depois, com os olhos já marcados pelos anos, contou a história para alguns mais próximos, que juram que ele falava com a verdade na alma.
Desde então, dizem por aquelas bandas que há mais do que mata e bicho no Sertão do Ubatumirim — há também mistério, daqueles que nem o mais velho dos caiçaras consegue explicar. E o caso do Seu Antonio ficou guardado como uma das histórias mais enigmáticas já sopradas pelo vento daquela serra.
FONTE : GUINHO CAIÇARA
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